Serpente: Arquétipo de Morte e Renascimento Cósmicos



Símbolo das potências do Caos, a Serpente Midgard (Midgardsormir) foi lançada ao mar por Odin para neutralizar o seu poder desestabilizador da estrutura terrestre e divina. Nessa fase já o Deus Supremo nórdico, Odin, havia sacrificado o gigante mítico Ymir como argamassa na edificação do Mundo Terreno - ponto de confluência entre o Céu e Mundo Inferior. É do sangue de Ymir que se forma o abismo oceânico: o habitat de Midgardsormir. O plasma do Gigante nutriu o voraz e enorme monstro, apelidado por Snorri Sturloson, na Gylfanning, de Jormungandr (vara colossal). Desde o começo dos tempos no fundo do grande oceano, cresceu desmesuradamente até se enlaçar em torno da Terra, sustentando-a até ao dia do Ragnarök, a Morte dos Deuses. Jormungandr é o Ouroboros, a serpente aneliforme que representa o ciclo de renovação, em que o fim não é abismo, apenas um perpétuo início dinâmico e crescente. O alfa e o ômega: a criação e a destruição em sentido ascendente.

Filho (no velho norreno, Midgardsormr é do género masculino) de Loki e da gigante Angrboda, “Angústia”, irmão de Hel e do lobo-gigante Fenris, Jormungandr forma os três aspectos das forças caóticas que estão na origem de todos os ciclos de transformação e destruição, simbolizando a luta perpétua entre as forças noturnas e as forças luminosas, que revemos nos confrontos entre Apósis e Ra na longínqua mitologia egípcia. A colossal oponente da luz e da ordem afronta a pujança solar e criadora do deus Ra. A serpente devora, mata e destrói. Ela existe para violar e destruir os puros e justos, decretando a perversão incessante como fonte de todo o mal. Jormungandr é uma espécie de mal necessário ao equilíbrio, pois esta serpente formidável é um elemento indispensável à estrutura do mundo, intervindo como se fosse os fundamentos de uma casa gigantesca que não pode nunca ser removida.

Quando emerge no Ragnarök enraivecida pelo confinamento das profundezas das águas, Midgardsormir provoca o terror diluviano, derrubando todas as plataformas que protegiam a estabilidade cósmica. Apenas Yggdrasil, o Grande Freixo, lhe resiste como garante da renovação da vida após a destruição. A ação destrutiva da Serpente do Mundo tem um espectro curativo, pois o seu veneno purifica as imperfeições acumuladas pela preeminência divina do panteão de Odin e produz uma nova Cosmogonia, assumindo assim por inteiro o seu significado escatológico. 

Jormungandr ou Ouroboros mostra-nos que a vida não é uma corrida tonta atrás do rabo, mas um processo espiralado que vai diminuindo até alcançar o centro, o ponto de origem. Nestes tempos de Kali-Yuga, a Humanidade procura encontrar o rumo que a devolverá ao centro, à sua génese espiritual. A espiral expandiu-se e afastou-se do seu núcleo, estando agora a dirigir-se no sentido contrário, por força da serpente caótica, responsável pelas tempestades que afetam o planeta. A serpente está na faceta destrutiva, na fase diluvina, que antecede a alvorada solar!!!


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