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A passagem para o Mundo de Lá

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O ato de caminhar pressupõe um movimento em direção a algo, de uma forma consciente e deliberada. A concentração nesse movimento conduz-nos para dentro, como uma força centrípeta, absorvente e que nos leva a lugares profundos do nosso self. A demanda do peregrino que vai deixando as suas pegadas ao longo do caminho, como testemunho do seu desprendimento do mundo exterior, ordinário e pautado por agruras, abraçando plenamente o  sentido de  religare. Terá sido essa motivação nas insculturas de pedomorfos feitas pelo Homem da pré-história num afloramento granítico, em Lomar (Penafiel)? Não se sabe ao certo, mas abre um belo campo de discussão fenomenológica.  O simbolismo dos pés é diverso e o que parece mais marcante, nesta história com páginas em branco, é o facto de representar uma impressão para a posteridade. Como se o imaginário coletivo impelisse os seus autores a deixarem uma marca imortal dos seus esforços em alcançar o Mundo de Lá, como guias espirituais para os seus des

A serpente, a pedra e a moura encantada

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O solo que pisamos preserva memórias arcaicas de ofiolatria trazida pela mítica "invasão de serpentes" descrita por Avieno que, por essa razão, apelidou o nosso território de Ophiussa. A consciência da serpente infiltrou-se nas liturgias e nas pedras que testemunham a sua presença como ídolo religioso e alegoria viva da Mãe telúrica. Fonte inspiradora de reverência e de vigor, o símbolo da serpente encorpou-se em crenças sobre a Vida e Morte, numa terra que, apesar da usurpação cristã, se manteria fiel à sua memória simbólica na imagem da Imaculada Conceição, padroeira de Portugal, e na heráldica portuguesa, durante muito tempo sob a égide ofídica. O atributo anímico da Grande Progenitora poderá estar eternizado na estátua-menir da Ermida (serra Amarela). Esta escultura pré-histórica concentra no granito uma possível reminiscência de ritos de fertilidade e de exaltação de uma ginocracia, relembrada nas fábulas sobre mouras encantadas e na adoração das sucessoras de entidad

Vinália!!! O Poder da irracionalidade

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Esgotam-se as últimas horas dedicadas à Vinália, dia de oferta dos primeiros frutos da vindima. Afrodite e Júpiter juntam-se a esta festa de deleites e de orgia dos sentidos. As ménades agitam os tirsos, simbolizando o poder sobre a fecundidade, e atiçam a excitação das mulheres, que se envolvem numa dança extática, de espasmo orgámiscos.. Báco desfaz-e em gargalhadas sumarentas, desafiando a ordem racional como que a abrir as portas ao irracional que emerge do inconsciente. O caos festivo e cartático faz com que a vida sorria intensamente.  O êxtase telúrco  entranha-se no meu corpo, pronto e sedento de cultivo e entrega-se aos afagos dionísicos, exaltando a virilidade por via da sublimação da fémea. Cantem mulheres!!! A serpente ergue-se das nossas cavidades, lançando hinos atrevidos ao universo!!!!  A  Vinalia Rustica, festival romano, catulpa para lugares cimeiros a deusa da sensualidade e da prodigalidade. As hetairas preparam a instauração de um novo reinado, ao longo da esc

Mulher, mãe: O Mundo, a vida. Nós Todos!!

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A aproximação do dia da Mãe  faz-me lembrar Freya, Cíbele, Deméter, Istar e tantas outras Deusas maternais de forte pendor sensual e promotoras de vitalidade, que o Cristianismo castrou e atirou os órgãos reprodutores para o olvido pecaminoso. Mãe, matéria, água e sexualidade formam uma equação desafiante, cujo resultado remete para a sumptuosidade da alma Humana, transmutada na imersão nas neblinas infernais. A Deusa é Una e a nudez do seu corpo é a mais expressiva representação da alma. Mãe induz a ideia de interior, aconchego, afeto, calor pelas carícias, humidade pelo seu leite, frio quando responsável castigadora.  Mãe, mulher compõem a base da nossa existência, a profundidade sagrada que dá forma e vida e que luta contra a repressão. Maria, a Virgem, andou pelos cantos da inferioridade dos apóstolos até ao século V; mas venceu a luta, sobrevivendo sob a condição forçada de Mãe de Deus e mais nada...tal como as mulheres após o Cristianismo de São Paulo, o misógino. Sim, Cris

Ó Frey regressa dos infernos e traz o teu falo

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Freyr, “o Senhor”, está rodeado pelos espíritos das florestas e das fontes. Trata-se de uma Divindade da Terra, que rege as chuvas fecundadoras dos campos. Simboliza também a luminosidade do sol que faz germinar as sementes e promove o crescimento do mundo vegetal. Ao Deus protetor do gado, eram dedicados cavalos, javalis, cães, os viajantes entre-mundos e do reino dos mortos trazem esporos de vida. Os Homens a ele apelavam o seu poder itifálico - paroxismo da sexualidade reprodutiva. Frey era invocado para as boas colheitas e, também, para a paz: no dia da sua celebração, nenhum sangue deveria ser derramado por motivos violentos, nem armas permitidas nos seus lugares santos. Generoso, o "Senhor do Ano repartia a riqueza pelos humanos e, assim, alegrava a sua existência e dobrava a esperança no futuro da prole. Com o seu barco Skidbladner espalhava fortuna pelos pescadores e soprava bons ventos  aos knorr de comerciantes e aos draukkar dos aventureiros dos mares.  A imagem

Ser como a Árvore: Vida e Conhecimento

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A árvore dá alimento, habitação, ferramentas, remédios, barcos, fogo, armas, sombra e conforto. É o mais antigo tema pictórico nascido no "ventre" de tempos imemoriais e dele restaram reminiscências da Árvore da Vida, do Conhecimento estampadas em diversas mitologias do mundo antigo. As representações arborescentes da Mesopotâmia ou Assíria, em torno das quais se envolvem duas personagens reverentes, em postura de  apelo e de agradecimento pelas suas dádivas, constituem as ancestrais das Árvores Sagradas da iconografia cristã. A conceção do Universo, sem espartilhos dogmáticos, foi cedendo à subordinação do pecado, e a fruta suculenta de sabedoria "parida" de símbolos da magia feminina, calcada como se fosse veneno. Vistas como entidades gigantescas vivas a quem a imaginação do Homem primitivo dotava de espírito consciente, as árvores eram garante de "pão", de conhecimento arcano e inspiração de imortalidade. Eram Mulheres-Árvores as parideiras de alim

Da terra das bruxas, parti com o riso de Baubo

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Em pleno dia, sob a força do calor do Sol, surgi de surpresa, a sacudir a letargia da rotina do Terreiro das Bruxas. A povoação da freguesia da Moita, no concelho de Sabugal, cruzou o meu caminho em direção à misteriosa Sortelha, terra dos lagartixos, onde se partilha a lenda da Dona Lopa. Mais uma versão, entre muitas, de mulheres do Outro Mundo persistentes  em afrontar os ditames do Cristianismo que as flagelou em superstições. Dona Lopa está na mesma linha da Dama de Pé de Cabra, uma lenda arcaizante de recordações de glória feminina, sem diferenças, nem subjugação. Héteras que o entendimento puritano escarneceu com promiscuidade e incompreensão do poder transfigurador da sexualidade.  Naquele cruzamento, outrora conciliábulo de mulheres de poder, restam memórias amedrontadas por manifestações de espectros que penetraram no subconsciente dos seus habitantes como meros sugadores de vitalidade. Naquele lugar de festim extático, Hécate fora evocada às horas abertas, patrocinando vo