Balder: a anunciação do Sol

E porque o sol hoje nascerá no regaço de Apolo, assaltou-me a vontade de resgatar Balder do Mundo álgido de Hel. O deus grego do Sol era celebrado neste dia, assinalando o crescimento do astro luminoso nos céus sombrios e o seu parente nórdico, o belo filho de Odin e Frigga, está também prestes a abandonar o reino da deusa da Morte. A beleza resplandecente de Balder enchia de vida os salões celestes de Asgard, até o dia em que a natureza destrutiva de Loki decidiu roubar-lhe o sopro, ao arquitetar uma maneira de o assassinar. Enquanto vivo, Balder era todo ele um corpo de luz resplandecente e à sua passagem todos os seres vivos se multiplicavam. Balder é a luminosidade da época de ventos húmidos e cálidos que todos aguardamos e desejamos num fase de frio intenso e de temporais violentos.

Balder é o espírito do sol triunfante e cicatrizante, que devolve a vitalidade e a alegria. O seu desaparecimento provocado por uma flecha forrada com visco lembra os rituais druídicos do verão. Os arcanos e sábios Druidas recolhem, no verão, o visco, filho do Grande Carvalho, com as suas foices douradas, preparando-o para o seu sono no reino da morte, para que possa renascer revigorado no solstício de inverno.

Hoje, com Apolo e Balder celebramos o seu despertar quase definitivo, como ponto de viragem de um ciclo contínuo e sem interrupções. O mito da morte de Balder é um gracioso estímulo para quem encara qualquer paragem como inercial, os solstícios são interstícios: suspensão do tempo para que se abram portais do Outro Lado para reativar a ligação com os deuses e ancestrais, assegurando-se assim um circuito construtivo e de crescimento. Balder renasce todos os anos com a estação luminosa e com ele traz draupnir, o anel que se multiplica em oito a cada nove noites. 

Parece estranho, mas é uma parábola maravilhosa a relação entre a morte e a vida. Balder faleceu e foi iluminar Helheim, os domínios da Senhora da Morte, também ela ambivalente: metade do seu rosto é negro, estéril e velho, a outra é branca, fértil e jovem. A deusa Hel rejubila com a presença do espírito solar, como uma espécie de garantia que no subsolo a semente encontrará alimento para poder irromper na superfície da terra robusta e vital, após a despedida do inverno, no regresso da primavera de mãos dadas com Balder.

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