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A mostrar mensagens de 2016

Ressuscitar o "nosso" Balder

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Uma vez que vamos retomar ao ciclo crescente do Sol, que culminará com o regresso triunfal do astro da vida no solstício de verão, recordemos a morte do belo e adorado Balder, o mais amado de todos os deuses germânicos. Essência mais pura da luz do Sol, o filho de Odin e de Frigga, senhora que regula a maternidade, tinha um caráter generoso, alegre e corajoso, alegrando os corações de todos aqueles com quem convivia. Quando começou a ser atormentado por pesadelos que lhe pressagiavam um fatal destino, solicitou ao pai que descobrisse o significado daquelas terríveis notícias vindas do inconsciente. Odin, lesto, montou Sleipnir e viajou até ao submundo para consultar a vidente que jazia morta em Helheim, mas mantinha a memória ativa sobre estas matérias sensíveis e irracionais. Disfarçado embrenhou-se pelas neblinas gélidas e infernais e despertou a feiticeira utilizando técnicas antigas de necromancia. Odin, primeiro, quis saber por que razão havia salas no submundo preparadas com tam

Vamos comer castanhas da vida

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Vim matar saudades comigo mesma e com aqueles que lêem o que por aqui escrevo, neste cantinho virtual, um cantinho que está cada vez mais perigoso para a saúde mental da humanidade. Não, não há riscos complicados se se predispor a espreitar esta janelinha que abri para o mundo que (ainda) não vejo, mas contato com gosto. O contato!!! Palavrinha mágica, que se vai perdendo à medida que as relações se extinguem na individualidade egoísta, materialista, consumista e possessiva. Não julguem que as festinhas pontuais, a assinalar marcos concretos do ano, outrora prenhes de significado coletivo, servem para o pessoal sentir que até convive bem, alegremente em grupo. Acho que essa hipocrisia incomoda bastante São Martinho. O santo altruísta, que divide a capa com o mendigo a tilintar de frio, produzindo o efeito taumaturgo de um breve verão para aquecer os desprotegidos.  As fogueiras de São Martinho, os magustos, as primeiras da época do frio, do escuro, da entropia, criam a resistência

Urda chama-nos para mais uma volta

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O calendário pagão assinala que a 29 de agosto a roca de Urda é o cetro mais importante deste dia, ao  cair do pano do mês consagrado ao imperador Augusto. A irmã mais velha das três Nornas simboliza os desígnios do destino, cujo fio de prata se alisa, desde o nosso nascimento, na Grande Roca cósmica.  É Urda que nos mostra a teia do nosso passado, mostrando passo a passo os nossos feitos, erros, escolhas feitas e faz-nos encarar de frente com tudo o que fomos construindo e questiona se é neste caminho que pretendemos persistir ou aproveitar a nova rota que elas nos oferece. É poderosa, nem os deuses mais fortes conseguem ludibriar a sua vigilância e é a sua mão que se entende na hora da nossa despedida deste mundo.  É Urda quem alimenta e regenera Yggdrasil com a água pura e cristalina da sua nascente, junto a uma das raízes da Árvore Cósmica que se une a Asgard, a residência celeste. A função de Urda, a Senhora da Origem, sobre a nossa existência assemelha-se ao ciclo do linho. Um

À procura dos anões

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Ao percorrer terras mineiras, em Barroca (Concelho do Fundão), onde do seu ventre saíra volfrâmio para  gáudio  do sustento económico do país, veio à minha lembrança a labuta dos seres minúsculos a quem Ódin deu corpo e existência senciente. Os anões, ou dvergars na língua germânica, de inócuas larvas que consumiam o corpo sacrificado do gigante Ymir no que se transformou no mundo terrestre e em todos os elementos que o compõem, a  homúnculos essenciais ao pulsar de vida no subsolo. No submundo em que a luz dificilmente penetra, estes seres de Svartalfaheim forjam a massa subconsciente que enriquece a alma humana e fertiliza a matéria negra da qual se extrai o nosso sustento alimentar. A negritude que oculta os seus rostos e a fraca pujança física condicionam os dvergars a uma presença incompreensível sobretudo para uma sociedade autocrática, estruturada de molde a convencer-nos que não vale a pena escavar bem fundo do que temos dentro, o tesouro oculto que faz parte do nosso poder pe

Memória: o mais belo espólio humano

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A redescoberta de mais um pequeno pedaço da nossa longa memória devastada pela indiferença a que o progresso nos foi viciando com distrações superficiais, efémeras e vazias, enriqueceu o dia consagrado a São João, o santo solsticial anunciador do Agnus. As fiandeiras cósmicas, as Nornas, demonstraram, mais uma vez, que sabem como deslizar o fio de prata pela roca e o fuso, orientando a minha intuição até às raízes da atual cidade da Maia, e promovendo um encontro intemporal com alguém que define o contacto com os artefactos como de "conexão emocional". A atenciosa senhora (a quem não perguntei o nome, porque na empatia dispensam-se apresentações) do Museu de História e Etnologia da Terra da Maia revelou-me o quanto o "maravilhamento" (expressão da sua autoria) provocado pelas peças aparentemente inertes em cada sala de exposições a faziam "entrar" na memória residente nelas.  A falta de sentido de preservação tem nos feito perder a magia emocional do h

Redespertar da magia das plantas

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Ainda nos restam duas semanas para desfrutar de junho, mês dedicado à deusa romana Juno - a congénere da grega Hera -, a Senhora soberana dos céus do período em que a luz é mais intensa, mas enfrenta o regresso do minguar dos dias. Por cá, por estas terras outrora pisadas pelos valorosos guerreiros Lusitanos e Galaicos, a atmosfera envolve-se de fragâncias afrodisíacas em honra dos santos populares que a demopsicologia sub-repticiamente adotou para manter vivas lembranças de festividades pagãs. A magia das ervas retorna agora do seu esconderijo subterrâneo para nos inebriar com sensações psico-sexuais libertadoras. Anda no ar o aroma da cidreira, do rosmaninho e toda a panóplia de plantas aromáticas com as quais purificamos o corpo, expurgando os males que nos condicionam. Sorrimos, sim, e abrimos a alma à sabedoria presa no inconsciente coletivo que os nosso antepassados preservaram por entre o rigor inquisitivo da Igreja. São Martinho de Dume, nos seus Cânones sobre Medicina Luso-

Em maio as fragrâncias são prazeres

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O Sol começa a ganhar força a meados de maio, sob a gerência da bela Maia, a irmã mais velha das Plêiades, progenitora de Mercúrio. Ainda embalada pela intervenção no restaurante celta Endovélico, lanço aqui algumas sementes ao corpo fértil da deusa romana, cuja essência camuflada no costume popular de enfeitar as janelas e as portas das casas com flores amarelas de giesta. Na suavidade da claridade da época, em tempos remotos integrado no corpus de ritos orgiásticos, desabrocha no peito de cada jovem os prazeres do regime de maternidade. A Mãe-Terra manifesta-se em qualquer um dos seus avatares em eflúvios ctónicos que nos recorda a reverência pelas dádiva da Natureza. Os ramos das Maias, protegem-nos das forças caóticas substanciadas na figura do Diabo, vulgo carrapato, e atraem a força fálica dos raios solares. As festas populares de maio são disfarces de cultos hetairistas suplantados pelo regime de paternidade, do Deus uraniano, intangível, por isso necessário o recurso intermedi

Celebração da Primavera em Viana

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Viana do Castelo ergue-se nas ruínas de uma citânia ibero-celta e no topo da colina virada para o rio Lima, o altaneiro santuário de Santa Luzia, a padroeira da vista, pela graça concedida ao capitão de cavalaria Luís de Andrade de Sousa, acometido de grave doença oftalmológica. Não terá sido essa a razão que Guilherme Guimarães considerou os olhos como uma das partes do corpo humano uma referência simbólica do corpo Mãe-Terra. Julgo que o jovem, uma das testemunhas da dança de integração, no culminar do encontro de Celebração da Primavera, se referia à dimensão espacial que a visão abarca desde a linha do horizonte, lugar de repouso do Sol, ao berço onde este renasce diariamente retemperado pelas águas salinas. A visão é um dos sentidos físicos mais requisitados, excessivamente operados no sentido de fornecer estímulos cerebrais, ocultando e renegando os restantes sentidos que o complementam e enriquecem a experiência sensorial. A este universo de "sentidos", acresce o

Sigurd: o modelo guerreiro-herói

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S igurd é um jovem de grande talento físico e mental, sendo o  paradigma do heroísmo dos guerreiros nórdicos. O filho de Sigmund inicia a demanda pela imortalidade no momento em que assassina o dragão Fafnir, antes um anão transformado em besta serpentiforme, devido à ganância que o prendeu ciosamente ao tesouro do pai (que ajudara a matar), e assim se tornou num símbolo de materialidade. A avidez de Fafnir afastou-o da realidade, isolando-o no terreno árido e tenebroso Glittering, no qual ninguém se atrevia a entrar. Sigurd é incitado a matá-lo pelo irmão de Fafnir, Regin, um ferreiro fantástico e versado em magia. Uma vez que exprime um aspeto terrestre-animal, pela agressividade como força da manifestação de um génio das trevas, estes monstros constituíam um excelente desafio iniciático para um povo predisposto a façanhas impossíveis. O lema de vida dos antigos povos de raiz germânica era um intenso orgulho na coragem, que marcava um ponto de mutação da condição humana para o est

A Pedra da Senhora

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O preâmbulo de 21 de setembro de 2015, pelo roteiro das pedras de Vila Nova de Gaia, deixou-me água na boca a propósito do Santuário da Nossa Senhora da Saúde, em Pedroso. A orografia deste espaço sagrado, agora cristão, imprimiu na minha alma o apelo de uma segunda visita, desta feita de regaste da entidade divina outrora orago naquele lugar fortemente gentio e de  reminiscências  do culto da Mãe Terra. Esse maravilhoso corpus mitológico de Mouras Encantadas que confere intensa vibração ctónica a Portugal, antes Terra de Ofiusa, a grandiosa Serpente Negra dormente no nosso subterrâneo antropológico. À lenda das pedras trazidas pelo mar que configuram o círculo de pedras sobre o qual assentam os alicerces da igreja, aditou-se um elemento fulcral para a compreensão das  fervorosas  orações femininas, que pude testemunhar no domingo - o dia de re-ligação à fé: a aparição da Nossa Senhora num penedo e com ela a inefável cobra.  A Senhora e a cobra os dois elementos arcaizantes daquel

A Mãe de Água

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Damos pouca importância ao que está por debaixo da imensa superfície em que colocamos os pés diariamente, na azáfama do trabalho, das compras do supermercado, na corrida louca pelos preços sensacionais da roupa na Primark, etc...etc e tal. Andamos sempre de cabeça no ar, a olhar para o "nada" ou para o "tudo o que não interessa". Felizmente, vou-me focando nos detalhes, nos pormenores que preenchem a alma e nos oferece um leve respirar do Outro Mundo. Pois é desse "Outro Lado" que nos chegam as melhores vias e intuições orientadoras do nosso real caminho. Num desses dias de observação, decidi dar a devida atenção às ruínas da “Mãe d’ Água de Mijavelhas”, que as obras do Metro do Porto puseram a descoberto e reconstruíram para nos deixar um legado, até à data ocultado, da memória etnográfica da cidade do Porto. Esta bela e granítica metrópole crescida sobre uma série de veios de água subterrâneos, alguns dos quais amiúde utilizados pelos romanos como rotas