Iniciação pela Morte nos sacrifícios de Odin e Balder



O enforcamento de Odin no Grande Freixo está carregada de forte simbolismo sobre a Iniciação pela vivência de uma morte aparente. Este episódio é um culminar de um processo de mudança profunda de consciência. Odin sabia que a sabedoria conduz o Homem à sua divindade retida algures nos cristais do tempos, em que se cortou a relação do corpo como veículo de transformação. A memória é por excelência um reservatório inesgotável e Odin tinha a noção disso quando salvou a cabeça de Mimir, ceifada pelos Vanir. Odin devolveu-lhe a vida através de encantamentos e colocou-a junto de uma das  nascentes que brotam das três raízes da Árvore Cósmica, e ligam-se a três mundos cósmicos.

Mimir, a memória ancestral

Para se entender a importância deste filho dos gigantes e tio de Odin, impõe-se uma explicação sobre o seu nome: Mimir deriva de Minni, que significa memória e se estiverem atentos verificam que um dos corvos de Odin chama-se Munin, o mesmo será dizer, memória...Ora. o Ase para atingir um elevado grau de consciência, transcendo os limites da razão, ele teria de recuar no tempo, até ao grande armazém da memória ancestral. A faculdade de viajar sem o constrangimento do tempo e do espaço seria obtida pela a água que brotava da fonte de Mimir. Este precioso líquido, sinónimo de vida, refrescava a raiz de acesso a Jotunheim, o Mundo dos Gigantes, os seres primevos e, por isso, guardiões da sabedoria antiga. Os gigantes constituem uma referência viva dos tempos idos na formação do Mundo, a partir do sacrifício de Ymir, o primeiro Gigante.

O facto de ter de ceder o olho esquerdo a Mimir, Odin abriu uma brecha no mundo dos sonhos, da imaginação e intuição, ao ficar retido debaixo da terra, junto da raiz do Freixo. Percebe-se que estes povos intuíram a relação do olho esquerdo com a atividade do hemisfério direito do cérebro. Todos os dias, após o pôr-do-sol, o olho diurno/direito de Odin- o Sol da consciência - encontra-se com o outro na escuridão e, em perfeito equilíbrio, e juntos iniciam uma jornada pelo mundo do sonho. Odin fica mais completo e mais capaz de conhecer as dimensões do espírito. Ao beber a água (para alguns o hidromel), enriquecida pelas informações de todo o conhecimento proveniente dos tempos dos gigantes, Odin recorreu a uma espécie de estimulante, um catalisador no processo de revelação mística das runas. Porque estes seres enormes, caracterizados pela força bruta da natureza - que eles próprios dão forma na diversidade de condições atmosféricas – encerram a sabedoria da magia da origem dos Tempos.

Sendo a Árvore um símbolo de proximidade aos Deuses, por ser elevada, por isso mais junto ao céu, foi o veículo da grande viagem xamânica de Odin, de encontro com a morte do ego, tornando-se no mergulho na sua Iniciação nos mistérios do Norte. Pendurou-se pelos pés, como o enforcado no Tarot, e com a cabeça para baixo para ficar receptivo às forças ctónicas de grande capacidade transformadora. O sangue fluiu com intensidade para o cérebro que em conjunto com a privação sensorial -sem comer, beber e dormir – e desencadeou a libertação do espírito do corpo, o que se consegue somente durante o nosso sono.  O sistema nervoso deixa de ctuar na medida em que Odin supera a dor do
ferimento que causou a si próprio.

Odin teve de estar próximo da sua morte para vislumbrar os sigilos mágicos num grito que não é mais a manifestação do Verbo. Com Odin, a linguagem marca uma viragem na consciência e na comunicação do ser humano. O Ase revela a força da palavra no encantamento (galdr).
O episódio em torno do destino de Balder constituiu outro dos aspectos da Iniciação pela morte. O assassinato do belo filho de Odin e Frigga não é o seus desaparecimento em definitivo e muito menos se perde pelas sombras do reino de Hel. Balder representava o anúncio do cumprimento do destino dos próprios Deuses de Asgard: o Ragnarok, a morte dos Deuses governados por Odin. Balder reergue-se dos confins da terra, marcando uma mudança de nível espiritual.


A morte é apenas uma ligeira interrupção numa eterna caminhada de regresso à vida.
 

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