O mistério de Hagalaz no número nove






O número nove na Tradição Nórdica encerra todos os mistérios da origem do mundo, como se poderá perceber ao longo da caminhada pelos nove mundos da Yggdrasil. Odin vagueou por entre os reinos cósmicos que compõem a diversidade espiritual de uma tradição que sentiu e viveu o nove como o número Mãe ou a Matriz de toda a criação. No FUTHARK descobrimos esta simbologia na Runa Hagalaz, a primeira do segundo dos três Aettir (família) de sigilos, no percurso que assinala o “regresso” ao nosso passado como entidade espiritual - constituindo também uma excelente oportunidade para elaborarmos a biografia da nossa existência. No final da jornada, tomaremos contacto com o domínio das Nornas (Três Irmãs do Destino-wydr), assumindo parte da construção da nossa teia da vida.
Se pensarmos no símbolo desta runa no formato de floco de neve, tornar-se-á perceptível a complexidade do seu significado. Terá sido este ideograma percebido pelo Deus da Sabedoria, Odin, ao cabo da longa viagem iniciática no Grande Freixo. Estando dependurado de cabeça para baixo, o campo de visão restringe-se e acentua a irrigação sanguínea no cérebro, criando um efeito muito especial que a ciência explica como sendo formação de fosfenos.
Ao deixar de entender a existência como reflexo somente do mundo uraniano, Odin pôde recuar até às suas origens mais longínquas da sua contraparte espiritual, reencontrando-se com a sua força animal ao sorver as energias ctónicas oriundas do submundo, ou seja do Reino de Hel, a Deusa que rege o mundo dos espíritos ancestrais, tanto assim que se situa no ponto norte do eixo cósmico, Niflheim. Em Helheim entramos na dimensão da magia das volvas (feiticeiras) e no domínio dos instintos, da paralisia e da inércia do inconsciente. Hel tem uma parte pálida e outra  brilhante: representação do poder da morte e da vida.
Este é o mundo dos mistérios escondidos e o doador de vida: o corpo é enterrado para poder devolver uma nova vida a quem falece. É força regenerada da serpente, como simbologia do ciclo eterno do Nascimento/Vida/Morte/Renascimento. Helheim é composto por vastos vales escuros que ladeiam o rio Gjoll e é guardado por Modgud (esposa de Heimdal, guardião da ponte do arco-íris) que só deixa passar quem revelar o nome e provar pelo sangue a sua descendência.  O caminho de Hel é percorrido em nove noites – é o lado escuro da própria Yggdrasill onde se efetiva a iniciação de Odin–, sendo marcado por diversos obstáculos, encerra os segredos da existência e é onde as runas estão ocultas. Trata-se do espaço onde dorme o conhecimento da transformação.
O Nove representa, neste caso, o ponto inicial da gestação do processo evolutivo dos que estão dispostos a largar a matéria entorpecente e da consciência racional. O Homem torna-se independente das forças externas e demanda a divindade que habita no seu interior.
Hagalaz, a nona runa,  sendo o depósito do material inerte do caos e da força do inconsciente ajuda-nos, a encontrar os processos formativos do pensamento ao mais alto nível. Por isso, é a Mãe Cósmica que dá à luz um novo ser após o período de paralisia causado pelo gelo que nos obriga a recuar no tempo até à nossa cristalização, daí que represente o granizo - uma forma cristalizada de água que destrói pela violência da queda, mas em estado líquido regenera os solos para o cultivo. Ela nutre como a Grande Vaca Cósmica, a Mãe de todas as formas de vida.
Os nove mundos da Árvore do universo da Tradição nórdico-germana encerram uma história muito especial:
Asaheim é a residência dos Aesir, o Grande Olho de Odin que observa os mundos e reina com as visões de Frigga sobre o futuro dos Homens; Alfheim alberga os elfos-brilhantes e estão próximos do Sol. Frey reina aqui podemos senti-lo em cada raio solar - ele tem o valor do ouro, um metal precioso e raro nos subsolos da Germânia. Os Elfos luminosos contêm a alegria das crianças e encantam os dias de Verão.  Midgard é onde todos nós estamos, o nível intermédio entre o Mundo Superior e o Inferior de Hel. Svartalfaheim pertence aos elfos-negros que trabalham o ouro, o sol que brilha na escuridão do interior da Terra. É aqui que pululam as forças telúricas que nos religam aos mundos insondáveis da nossa existência. Os anões vivem também aqui, mas trabalham o ferro, a dureza das emoções e controlam o subconsciente. Em Jotunheim reinam os gigantes, os primeiros seres do período do caos, as forças indomáveis da natureza e terreno inóspito de montanhas rochosas e gélidas. Vanaheim está no lado oposto a este mundo, a oeste, o lugar onde o sol morre e se vive o tempo em que o Homem dependia das "boas" relações com a natureza e com os mortos.
Chegados ao final da jornada, percebemos que o número Nove, de acordo com a Tradição do Norte, potencia o processo dinâmico da evolução e nos oferece pistas para a perfeição, para o sentido do Todo. Mas antes de qualquer avanço, ficamos presos no cristal de Hagalaz, numa hibernação necessária à prospecção do que realmente somos e para onde queremos ir.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A serpente, a pedra e a moura encantada

Da terra das bruxas, parti com o riso de Baubo

Pelas pedras de Gaia