Suástica: o Centro Imutável - a Luz Cósmica


(Excerto do artigo Exorcizando a simbologia da Suástica na compreensão do Absoluto, publicado sob o pseudónimo  Valquíria Valhalladur na Anima Mystica revista digital)

Um dos símbolos mais antigos do mundo de origem ariana, a cruz suástica reproduz a rotação da energia, e assim se movimenta também a Roda da Vida, o vórtice simbólico que, ao girar, desenha no éter uma dupla espiral. René Guénon vê uma relação íntima entre a espiral dupla, a dicotomia yin-yang, e a rotação helicoidal da suástica. "Pode considerar-se como sendo a projeção plana dos dois hemisférios do Andrógino, e oferece a imagem do ritmo alternado da evolução e da involução, do nascimento e da morte (…) são as duas metades do "Ovo do Mundo", e tem o mesmo sentido de rotação da suástica, já que representam a revolução do mundo em torno do seu eixo".
A suástica representa a luz concedida pela divindade omnipotente quer seja essa Manu, Buda ou Brama do Oriente, ou Thor ou Zeus do Ocidente. O seu grafismo indica um movimento de rotação em torno de um centro imóvel, onde habita o deus supremo ou se localiza o polo superior. A suástica é o selo que concentra a Inteligência Cósmica da qual emana a Luz Espiritual e formula a Lei que regula os ciclos cósmicos e humanos. É equipolente à noção esotérica da montanha sagrada, ponto de unificação do céu com a Terra, ou seja, o centro do Mundo, o Imutável, e sobre ele brilha a estrela polar – o polo celeste. No monte Hissarlik, terreno da velha Troia, foram recuperados vários espécimes de suásticas na maioria com um buraco no centro, recriando eixos espiralados. Trata-se do ponto onde a criação começou. É, portanto, a origem. Em alguns mitos criacionais, a vida é gerada pela ação do calor, luz ou fogo sobre a água, onde se concentra a matéria não-manifestada. 

George Dumézil carateriza Heimdall como “o primeiro Deus; o inicial”, o que nasceu no princípio dos Tempos, sendo, por essa razão, um importante arquétipo da Criação. Incluído no panteão nórdico, Heimdall é uma divindade pouco pujante e nem sequer está no topo da hierarquia, no entanto é o arquiteto da Humanidade, o fundador de linhagens e tem uma função escatológica - é ele que alerta os deuses da invasão dos agentes do caos no Ragnarök. Ele está na origem e no fim do Mundo. O seu habitat mitológico em Himinbjorg, montanha celeste, junto à ponte Bifrost, coloca-o no limiar do mundo divino e no limite da Terra - no topo do eixo central para onde aponta, precisamente, Tiwaz. Esta runa exemplifica, no FUTHARK, a estrela polar, e indica o centro absoluto em torno do qual gira o firmamento, que é o mesmo que o trono de Deus, a essência do Universo, no fundo inspira o triunfo da luminosidade sobre as trevas. A suástica representa o poder sobrenatural do deus Supremo a expandir-se contra os seus inimigos. É uma força poderosa e criadora. Heimdall simboliza este núcleo que brilha no Alto e a através do qual toda a energia flui e ativa a vida orgânica, sendo o mesmo ponto central que anima a Suástica. Heimdall significa “o que ilumina o Mundo” e é descrito como sendo o deus da Luz e do brilho, e compõe o mitologema do fogo e da distinção das classes sociais do hindu Agni[1]. O fogo transporta o conceito de pureza e de sagrado pela sua origem na divindade e, infelizmente, foi corrompida pelo contacto com elementos inadequados e ciosos pelo poder. Heimdall e Agni tornaram-se os primeiros sacerdotes e ensinaram ao Homem a organizar-se em comunidade, segundo uma lei hierárquica, e como reunir-se socialmente em torno das lareiras.
Bifrost é o arco-íris, "a ponte celeste", símbolo que religa o mundo sensível ao suprassensível. Heimdall é o mediador ou o pontífice, "o construtor de pontes", que nos ajuda a estabelecer comunicação com planos transumanos e ergue a tocha que nos ilumina no trajeto de transição do terrestre para o suprassensível.

Heimdall rege Mannaz, "Humanidade", "Homem", runa que sintetiza os assuntos administrativos, sociais e comunitários; além de indicar a ideia de androginato, numa alusão ao estado original no momento inicial da criação. O laço Yin-Yang volta a aparecer aqui. Na fusão no conflito das polaridades manifesta-se o centro, o poder Absoluto. A ponte completa-se.
Emblema de Cristo, nos encontros dos primeiros cristãos nas catacumbas, de Buda, já que representa a Roda da Lei. Os tibetanos executam rituais com velas recriando a forma de uma cruz suástica, ficando o Lama, "o superior", sentado no seu centro, como que girando simbolicamente em torno do seu centro imutável e que frequentemente representa Agni, deus hindu do Fogo Sagrado. Encontramos suásticas nos podomorfos esculpidos nas rochas a personificar as pegadas santas de Buda pelo mundo, traçando os trilhos do Nobre Caminho Óctuplo do Budismo: a roda do Dharma de oito aros, aludindo à rotatividade do puro potencial de transcendência.
No glossário Anglo-Saxão e Escandinavo, aparece como fylfot, a roda dos quatro pés: do norreno fiöl, cheio, e fot, pé, sendo, em alguns casos, insculpida como uma cruz de braços pediformes. A passagem do Omnipotente pelo plano terrestre ficava assim gravada na pedra, de resto, o arquivo natural mais utilizado pelo Homem primitivo, durante a sua dialética em atestar a presença do divino e, muito provavelmente, vivenciar uma metanoia.


[1] A função mitológica do hindu Agni é idêntica à do escandinavo Heimdall: ambos viajaram longas distâncias, atravessando o mar, com a missão de instruir e dividir a humanidade por categorias funcionais. Agni transmitiu o segredo da criação do fogo por fricção; embora não lhe seja objetivamente atribuído, Heimdall comporta a mesma pureza do fogo, pela particularidade de ser "brilhante" e porque combate com Loki, o deus do fogo destrutivo, no final dos Tempos. Heimdall apresenta-se com o nome de Rig, e dorme, três noites e em momentos diferentes, no meio de três casais, e assim nasceram os escravos, os agricultores e os nobres. O três é um número da criação.

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