Conversa com o pénis de Frey

Fragmento de um amuleto-pénis romano (Museu de Penafiel)
Para representar fisicamente o poder regenerativo do sol primaveril, o indivíduo antigo adotou a imagem da masculinidade, como símbolo desse poder sobrenatural e genésico. O boi/touro e o bode tornaram-se os arquétipos solares por excelência e os seus órgãos genitais símbolos supremos de culto. O falo era venerado em ereção: hierofania da divindade geradora de vida. O esplendor do vigor másculo é o agente ativo da fecundidade da terra, animais e dos seres humanos, e garante da prosperidade e dos prazeres.

O culto fálico tem origens longínquas, do tempo em que o indivíduo se apercebeu do seu valor em todos os processos produtivos. Pénis e vulvas formavam uma dupla iconográfica erguida nas planícies reconhecidos em menires e mamoas - os templos sagrados do Homem primitivo. O linga de Xiva retrata essa fusão: o falo do deus apoiado na vagina da deusa numa cópula de procriação perpétua. O hierogamos entre Vénus e Marte, de Ísis e Osíris, Freya e Frey é o reflexo do entendimento de que as atividades agrícolas estavam fundeadas na ação e vontade do sagrado, por isso criavam personificações sobre as quais depositavam os seus anseios.

Qualquer imagem priápica simboliza o orgasmo masculino, do qual brota a semente fertilizante. A runa Uruz  exprime a ideia de água seminal, associada à força do auroque, e vem logo a seguir a Fehu, a primeira runa do FUTHARK, sob a regência de Frey, o Priapo escandinavo, e senhor do gado e personificação dos raios solares. O falo é o princípio ativo, o canal do sémen, a coluna que sustenta o equilíbrio da natureza e da espécie humana. É calor, luz, por isso de natureza semelhante à do sol nascente, que faz despontar a semente.  

A representação de Frey de pénis ereto foi o que nos restou do templo de Upsala, descrita por Adam de Bremen (numa fase tardia dos cultos escandinavos já rendidos à influência da estatuária dos deuses). A divindade Vanir simboliza a força fecundante do sol sobre a terra recetiva após o pousio do inverno e é também símbolo apotropaico, do mesmo modo que os amuletos-pénis usados profusamente pelos romanos para neutralizar o poder destrutivo do Invidus. O falo de Frey concentra um significado para lá do sexual: é igualmente uma arma que protege e combate as forças do caos. Ao abdicar do seu gládio - analogia material do seu falo - como dote de casamento com Gerda, Frey é obrigado a enfrentar Surt, Gigante do Fogo destrutivo, com uma haste de veado, animal solidário às forças solares

O pénis tem a mesma força triunfante do sol, o mesmo poder de conquista da vida. Isto não legitima, porém, os comportamentos do pseudo sexo forte. O pénis não passa de um órgão solitário e estéril quando o homem o assume como estandarte da sua superioridade sobre a mulher. Nem o homem, nem a mulher se anulam: o pénis e a vulva complementam-se, dialogam, trocam impressões de como caminharem como companheiros de uma longa e eterna viagem. 

A inteligência é assexual. O pénis não pensa, apenas reage. A vulva não pensa, apenas entrega-se à sensação. E quando formos capazes de os percebemos como partes do nosso desenvolvimento e autodescoberta, então, sim, serão ótimos instrumentos da nossa inteligência.

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