Walpurgia: Festival das Feiticeiras




Em Portugal, a noite de 30 de abril para 1 de maio é enfeitada com giestas uma planta arbustiva, de flores da cor do sol. É esta característica que lhe confere propriedades mágicas de proteção contra o temido "carrapato", um metaforismo do diabo, agente destrutivo que representa as forças caóticas do inverno. E é das giestas que se fazem vassouras das aldeias e que tanto inspiram a montada diabólica das bruxas. A tradição diz para serem colocadas do lado de fora das portas com intuito apotropaico. A flor amarela da giesta simboliza o poder curativo do sol e o triunfo do Rei da Vida sobre o Rei da Morte. O que agora é uma mera expressão folclórica e supersticiosa é uma bonita reminiscência do combate virtual das duas metades do ano, na viragem da Roda Sazonal, que se atualiza anualmente na alegre noite de Beltaine, de cujas fogueiras ao ar livre emanam fragrâncias de nova vida e encantamentos de boa sorte.

É a celebração do poder da fertilidade e a derrota da esterilidade do inverno. Nas tradições germânicas esta é a noite do festival das feiticeiras.  As feiticeiras embrenharam-se no imaginário coletivo como seres paradoxais e tenebrosos e fazem parte do reportório de elementos sobrenaturais que participam no grandioso trabalho de promoção de vida. Reunidas no cenáculo diabólico, em Brocken, festejam a noite de Walpurgia que ilumina o firmamento dos eslavos, escandinavos e germanos. A ocorrência de um fenómeno natural confere um cariz extraordinário a este lugar mítico. O espectro de Brocken é uma sombra composta por anéis coloridos criada quando o Sol está próximo do horizonte, cujos raios incidem sobre nevoeiro denso que encobre o pico da montanha. Brocken é a montanha mais alta do maciço de Harz da parte norte da Alemanha, sendo povoada nesta noite por bruxas em bailados frenéticos, que afastavam a neve e afugentavam os cães uivantes do Caçador Selvagem e executavam um combate atmosférico. É uma noite de caos e de resistência do que resta do Inverno. No dia seguinte, festeja-se a glória da luz, da fertilidade, das flores e da lubricidade das danças em volta do mastro de Maio.

O folclore ilustra esta reunião no breu da véspera do festival de 1 de maio, envolta em trovões e relâmpagos que disparavam subitamente no céu à medida que as bruxas se lançavam para o altar onde o Diabo ministrava a missa negra. Elas beijavam o casco fendido do Grande Senhor do Sabbat e assim prosseguiam a festa em intenso frenesim até ao primeiro cantar do galo.

O festival de Walpurgia é inspirado nas práticas de Valborg/Walburga na celebração da chegada da primavera. Danças, fogueiras ao ar livre, muita bebida, vivia-se um estado anímico carnavalesco, semelhante à das Bacantes, no outono. A direção das chamas da fogueira indicava como seriam as condições meteorológicas da primavera das comunidades antigas: se para sul, era certo que seria fresca; se para norte, cálida e produtiva, e quanto maior for o raio de expressão da claridade destas fogueiras, maior seria a extensão de campos abençoados. 

A Noite de Walpurgia é, acima de tudo, um grande momento de convívio e festim entre a comunidade e uma forma de participar no renascimento da natureza.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

A serpente, a pedra e a moura encantada

Da terra das bruxas, parti com o riso de Baubo

Hoje, falo da Mãe esquecida