Sommarblót: Saudemos o regresso do Sol

 
O Sol, princípio vital e criador, regressou oficialmente, hoje, dia 14 de abril, ao seu trono no firmamento. O festival do Sommarblót recupera a celebração da chegada da segunda metade do ano, o período mais luminoso e produtivo que na noite de 30 de abril para 1 de maio é coroado após a vitória sobre os agentes do caos, que governaram a atmosfera no inverno. O Grande Astro diurno sobressaía por entre os vários conceitos esculpidos na arte rupestre escandinava da Idade do Bronze, desempenhando assim um papel central nos gelados e sombrios países setentrionais. Não sendo propriamente objeto de culto, porém, o astro-rei suscitava grande apreço sempre que surgia imponente e vitorioso no firmamento no dealbar da primavera.

A promessa da sua ressurreição no Jól cumpre-se neste preciso momento em que se festeja as primícias da vegetação e do gado, e o início da cura dos solos expostos ao frio estéril. É o prenúncio do fim do caos, o renascimento da vida, da luz, da felicidade e da prosperidade. É o arranque do processo de aquecimento que devolve o dinamismo bloqueado pela neve e o gelo. O sommarsblót saudava a elevação do Sol sobre as trevas. A festa agora adquire matizes de cor e alegria sob a égide do regresso do grande luminar. Na Islândia actual louva-se o Sumardagurinn fyrsti, ou seja o primeiro mês do Verão (de 14 de Abril a 13 de Março), na terceira quinta-feira de Abril.

A Ynglinga Saga declara que se trata de um dos maiores festivais do ano, designando-o por Sigrblót (ritual da vitória – Sig). O Sigrblót é dedicado a Odin, o doador da vitória (Sigtyr) e o garante da felicidade e prodigalidade de um rei - fugindo, portanto, das normativas do ritual anterior, em março, Östara, que celebra a estimulação das forças fecundas e toda a simbólica da fertilidade e abundância. As motivações do Sigrblót centravam-se na valorização do espírito guerreiro e na preservação da soberania. Ao erguer o corno de hidromel evocava-se o poder da divindade suprema do panteão nórdico, a quem se pagava um imposto como aliciante para obter a sua proteção nas expedições bélicas e comerciais prestes a começar. As perspectivas de enriquecimento espevitavam um povo reconhecidamente ambicioso por novas oportunidades comerciais e sequioso por explorar terrenos férteis, para além das suas fronteiras. Trata-se de um período dominado por confrontos belicosos, que aconteciam somente durante a metade do ano mais luminosa, e de exacerbação das castas nobres guerreiras dominantes. Suplica-se pela sorte e estima de Odin, em contrapartida pelo seu auxílio na defesa de ataques e na conquista de territórios inimigos. Os espólios de guerra constituíam um significativo indicador do triunfo da campanha. O ouro, peças valiosas e as armas confiscadas aos seus oponentes contribuíam para o incremento do tesouro de um clã, sendo cuidadosamente guardadas em local secreto, cuja localização era entregue ao sigilo do góđi.

A cerimónia visava satisfazer os anseios de riqueza e boa-sorte do soberano. Exalta-se o poder e honra do nome de um rei e a memória dos seus gloriosos antepassados - virtudes testadas em situações de conflito. Por isso, era muito importante ter Sigtyr como aliado, pois só ele poderia conceder a vitória e a longevidade de um líder. A imortalidade do nome constituía o bem mais precioso na concepção de um povo votado à guerra e a constantes provas de coragem. Odin, deus do furor e do êxtase, concedia esse favor especial em função do grau de desprendimento. Ao rei Oen, por exemplo, exigiu-lhe que imolasse nove dos seus filhos para que lhe prolongasse a vida entre dos homens. 

Este ritual de “abertura do Verão”, no fundo, coincidia com a primavera, pelo que as datas da celebração variava de ponto para ponto na Escandinávia: O Sivthjod, por exemplo, diz que no mês de Góe (14 de Fevereiro a 13 de Março), tinha lugar um grande festival pela paz e pela vitória do rei – com idênticas características ao do Sigrblót. 

O Sommarblót é, acima de tudo, mais um indicador de que a vida está sujeita a um processo contínuo de regeneração e que da morte/inverno vem a vida/verão, da noite nasce o dia e o sol sucede à lua. O Sol na mitologia nórdica é do género feminino, representando o princípio criador e gestante.

Este é um bom momento para honrar a natureza como engrenagem perfeita que não necessita que o homem altere o seu ritmo natural, e quando contrariada, reage violentamente.

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