O despertar do novo guerreiro


Vimara Peres:
 o guerreiro que reclamou o vale do Douro
Ainda estamos no início de 2015 e já sentimos de forma indelével a ação de Marte, Senhor de 2015. O Deus da Guerra, do terror, da raiva e da vingança vai recordar-nos, ao longo deste ano, tempos negros, de violência que pautaram a Idade do Ferro e do domínio patriarcal sob o jugo marcial do desejo de conquista e de domínio. Características que deixam no ar o cheiro a putrefação, de destruição e anuncia o regresso (que não é assim tão inesperado) à brutalidade da ignorância encapotada de matizes de uma suposta inteligência superior. Os atentados em Paris não foram casos de horror isolados: há quase todos os dias algo do género em países ditos do terceiro Mundo, etc. e tal, e a um nível microcósmico na sociedade dita civilizada, mas doente.

Mas será Marte uma divindade tão desprezível?????Não, não é. Marte contém uma poderosa energia de transformação e para a espoletar basta juntar uma dose equilibrada de inteligência elevada e teremos o fermento ideal para o crescimento, para a mudança, para o novo que se abre defronte dos nossos olhos -e só não veremos isso, caso não nos interesse. Pois bem: Marte é uma divindade romana, Ares para os gregos, Tiwaz para os nórdicos. Quaisquer que sejam os nomes, os rostos, as vestimentas, o objetivo vai dar ao mesmo destino: força masculina, virilidade, agressividade, mas também proteção e crescimento. Estranho, não é? Sim, mas só para aqueles que conhecem uma das vias: a destruição e o jugo.
 
Tiwaz é a divindade que impele os guerreiros à vitória, à coragem e também à justiça. Porque é Tiwaz que ilumina as Assembleias de Homens Livres (All Things) e brilha no céu sob a forma de Polaris, a estrela-guia de marinheiros e de guerreiros que se fazem ao mar em busca de bens e terras férteis. É o olho do céu que observa e vela pelo ser humano e o ajuda a ser mais feliz e realizado. Tiwaz é como o Marte romano que zela pela saúde e integridade do gado, pela produção dos solos e faz despontar a semente lançada à terra escura e húmida: ambos são portadores de vida e de fertilidade. Estas divindades não se limitam a derramar sangue (curiosamente Marte rege a hemoglobina): são duais, como todas as divindades, assim como nós somos duais. A ambivalência enriquece-nos, desde que saibamos usar as doses certas de cada uma das partes que ajudam a compor o todo.
O segredo está, pois, no equilíbrio.
 
Acabámos de nos despedir de um ano de Thurisaz e caminhamos à descoberta de um ano em que Uruz dominará. Uruz é uma runa vincadamente masculina, cujas características encaixam-se às de Marte. Quem participou nos meus workshops de Posturas Rúnicas sentiu no corpo e na mente a robustez de Uruz, a runa que mantém intacta a memória do Auroque que desapareceu na Europa há mais de cem anos. Uruz simboliza a força no estado mais selvagem, ou seja, mais puro e mais forte, e que enfrenta os obstáculos com uma persistência jovial. Não existem barreiras para Uruz, mas um horizonte vasto e inexplorado, excitante, por isso simboliza tudo o que é novo e saudável. Esta força não domesticada oferece-nos os instrumentos para eliminar o que é velho e caduco, e convence-nos a escutar a coragem que reside escondida dentro de nós. Sendo uma energia jovem, contém os mesmos riscos e perigos da adolescência. À confiança de Uruz é necessário acrescentar uns pozinhos de bom-senso para evitarmos catástrofes. É o velho dilema de Marte: dá-nos carradas de energia, mas dá-nos pouco paciência e moderação - o resultado nem sempre é construtivo.
 
Uruz é a runa que nos recorda ainda os jovens recém iniciados nas artes da guerra, que acabam de se despedir da dança frenética e iniciática conduzida por Ódin, Mestre do Êxtase. A conquista sobre o animal, o Auroque, a quem o jovem retirava os chifres como troféu culminava um importante rito de passagem que teria sequência em novo ritual, desta feita de integração na sociedade de guerreiros. Todos estes passos aludem a mudanças radicais, que dão sentido divinatório à runa Uruz. Na sociedade atual já não existem estes pontos críticos - o que é uma pena - que dariam um significado maior à nossa existência e amplificaria a nossa consciência e dar-nos-ia um sentido de unidade.
 
Já não vemos os jovens semi-despidos, a balbuciar umas palavras inteligíveis, a bailarem sob o céu aberto da noite, com duas lanças na mão e sob o efeito psicotrópico dos cogumelos que nasciam da espuma da saliva de Sleipnir. Os rapazes submetiam-se a estas provas com o objetivo de dar sentido ao destino que estavam certos de que iriam concretizar. É a falta de propósito que tornou a juventude órfã e entregue a uma existência desconhecida. Aproveitemos as sementes de mudança que Uruz vai espalhar ao longo de 2015 e comecemos a plantar alicerces mais fortes - quem sabe se não surgirão novos guerreiros?!!
 
Uruz carrega a potência de vida, é uma runa de fecundação: tem a mesma capacidade de penetração de Marte, abrindo novos sulcos na terra, dando-lhe impulso de crescimento; e também é uma runa marcial- usemos essa força com sentido de justiça de Tiwaz para tornarmos o mundo melhor, mais construtivo.

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