É o tempo das Bacantes

Este é um bom dia para resgatar das camadas de poeira o divino Falo. E porquê? Simplesmente, porque era a 23 de outubro que tinham lugar as festas em honra de Baco, esse deus amaldiçoado pelo "pecado" pelas mentes puritanas que decidiram esconder a "árvore do prazer" por debaixo do manto da luxuriante folhagem do pudor. Demos vivas, pois ao sagrado Senhor, que nas mãos das mulheres não apenas cresce em vigor como é a partir delas que a sua existência faz sentido. É tempo de abolir a falocracia que transformou o pénis num instrumento de poder castrador, como que se pudesse subsistir sozinho em auto-delícias egoístas. Nós, as mulheres, temos uma vigorosa palavra a dizer a esse respeito. Porque era atiçado nas mãos das mulheres da antiguidade, em desfiles lascivos catalisadores das forças reprodutivas da Natureza.
As bacantes semi-nuas subiam ao alto das colinas, de tirso na mão para que a personificação de Baco não esmorecesse na estação fria e de intensa sombra. As dançantes fêmeas na embriaguez do prazer sexual sem mácula antecipavam as benesses que Baco armazena no outono para nos brindar nas colheitas. O Falo não é aqui um órgão: é a força que anima a vida biológica, o Sol que nunca esquece o seu retorno na primavera para se unir à vulva terrestre. A Bacanalia, para os romanos, e a Phallophoria, para os Gregos, são eventos propiciatórios de bem-estar, mas cujas procissões alegres e ébrias incomodaram moralistas do controlo, como Eurípedes, que decidiu denegrir estes cultos na tragédia "As Bacantes". É uma pena termos herdado essa cultura de falocracia racional que, ao longo da história, despojou a humanidade da candura do convívio com o mundo natural e distanciou relação entre os géneros.
O falo acompanha a linha descendente do Sol. Átis esfrega o seu pénis na casca grossa do pinheiro e deixa Cíbele chorosa e ansiosa pelo cortejo alegre e colorido dos seus sacerdotes eunucos. Balder morre com um tiro de flecha embebida em visco e é enviado para os reinos de Hel. O submundo prepara agora banquetes luminosos enquanto à superfície, andamos tristes e deprimidos pela ausência do Belo Senhor. Deixem passar as bacantes, apenas cobertas por uma pele de tigre, libertam os cabelos e iluminam o espaço com o fogo controlado das tochas. Freyja junta-se às danças fálicas destas mediterrânicas mulheres sexualmente livres, chegando transportada no carro puxado por gatos selvagens. No final das celebrações báquicas, elas despedaçam o touro sagrado com as próprias mãos e comem-lhe a carne intensa e saborosa e transferem para si a força solar do animal sacrificado, numa união mística com o deus. Esse animal lunissolar que o deus Vitória voltará a sacrificar em dezembro, como prova da sua capacidade de renascer.
Vénus, Ceres e Freyja fazem companhia a Príapo como símbolo supremo da fecundidade. Isto mostra, mais uma vez, que o Falo não caminha isolado: ele precisa da vagina para Ser. Homem e Mulher, lado a lado, numa sagrada comunhão orgíaca dos Mistérios de Eleusinos. O perdido templo de Beleus, Babilónia, albergava um ídolo bicéfalo, com um rosto de homem e outro de mulher, e com as partes genitais de cada um.

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