Em abril desabrocha a flor do coração

Abril, mês de abertura. A terra abre as suas entranhas para receber a semente, as flores espreguiçam as pétalas e erguem-se do sono do inverno. Na Roma antiga, Afrodite regia o quarto período do ano; entre os Anglo-Saxões era a entrada em  Eastermonath, mês da deusa Eostre, da qual resulta o inglês Easter (Páscoa) e conhecemos sob o nome de Ostara, venerada pela comunidade Asatru. Perderam-se os rastos das festas a Ela dedicadas, resta a lembrança sua existência no seio de vários braços étnicos germânicos.

A etimologia de Ostara virá do Proto-Germânico Austro, também uma deusa, e a sua regência era assinala com ovos decorados e lebres, animais lunares que regressam das tocas como arautos da luz que se aproxima da vitória. Austro soa idêntico a Austri, o leste no dialeto antigo escandinavo. O Sol regressa da tumba empoleirado nas costas das altas montanhas, cujo tapete branco de pura neve cede, lentamente, num combate sereno de resistência do Senhor Inverno. O austero rei do frio vai perdendo poder, ao longo dos dias, transmitindo-nos a sensação de esperança de que as adversidades, por mais persistentes que se tornem, vão-se rendendo à resiliência.
 
Abril faz-me abrir o peito para deixar que a luminosidade de Ostara insemine o meu coração, uma das portas que conduzem o buscador à minha alma. Porque o brilho dos meus olhos consegue manter-se intacto, apesar da tristeza, da crise, da desilusão que alastra à volta. Com Ostara vem também o raio amoroso de Afrodite. A sua beleza velada pela superficialidade está lá, tão resistente como aqueles que mantêm a cabeça erguida e o peito ainda recetivo a acolher os frutos de sementes lançadas numa terra cada vez mais estéril.
 
Ostara é a lembrança de pedaços da Idade de Ouro, em que o indivíduo comungava a vivência com os deuses e predispunha-se a encontrar as maças das Hespérides. É paradoxal que um mês de abertura inicie com o dia das artimanhas. Parece-me uma parábola divina para testar a nossa clarividência. Loki recebeu-nos no primeiro dia de abril, de sorriso sarcástico, à espera de nos apanhar desprevenidos, contando que continuemos na ilusão. Se sim, então, a semente que devolvemos ao solo pouco frutificará, a sua flor de pulcro engano e o fruto será amargo. O ciclo de passagem para a estação quente, a segunda do ano, que este mês celebraremos, é um bom exercício iniciático: a vitória simbólica da força do sol na derradeira noite de abril, mimetiza o triunfo do espírito bem construído, por se ter deixado amadurecer pelo lado  positivo da experiência, e se torna em Balder renascido.
 
Continuação de boa Ostara!!!!!
espreguiçar

espreguiçar In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2014. [Consult. 2014-04-01].
Disponível na www: <URL: http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/espregui%C3%A7ar>.
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